Review: Call of Duty: Modern Warfare
Shooter icônico retorna com multiplayer ágil e campanha
interessante, mas com tropeços
Call of Duty 4: Modern Warfare
foi lançado em um contexto totalmente diferente do atual: George W. Bush ainda
era o presidente dos EUA, os ataques de 11 de setembro de 2001 tinham ainda mais
influência na cultura do que hoje, e o fascínio pelas operações modernas das
forças militares do Ocidente era grande.
A Activision e a Infinity Ward,
sabiamente, aproveitaram esse momento para finalmente tirar Call of Duty da
Segunda Guerra Mundial e trazê-lo à modernidade, diferenciando-o de rivais como
Medal of Honor, Halo e Battlefield, que ou se mantinham no passado, ou
imaginavam futuros diferentes.
Agora, anos depois de CoD4 e suas
continuações — sem contar um remaster —, reiniciar essa franquia com um novo
jogo, agora simplesmente chamado Call of Duty: Modern Warfare, significa lidar
com os temas de maneiras diferentes: há uma cobrança maior pela justificativa
por trás da violência, somos impactados de forma diferentes pela ideia de
atirar uma metralhadora. Para muitos, armas automáticas estão mais associadas a
massacres de civis do que ao combate de infantaria.
E assim, pelo menos na campanha,
o novo Modern Warfare ousa explorar não só a guerra, mas o pensamento e a
moralidade dos seus personagens com uma história mais brutal. Mas, como um
jovem saindo da puberdade para a vida adulta, o jogo não sabe bem lidar com
todas as responsabilidades que a maturidade demanda.
A história do novo Modern Warfare
envolve um país fictício no Oriente Médio — Urzequistão — que está no meio de
uma guerra civil. De um lado estão Farah e são irmão Hadir, líderes de uma
resistência que combate os anarquistas da organização terrorista Al-Qatala, que
na primeira missão da história são vistos roubando um perigoso gás russo para
usá-lo no combate químico.
As forças russas, aliás, ocupam o
país há anos e são responsáveis por acontecimentos trágicos que afetaram
diretamente os protagonistas, auxiliados na narrativa pelo agente da CIA Alex,
o sargento da SAS Kyle Garrick e um velho conhecido dos fãs: Capitão John
Price.
A seguir vem uma série de missões
que se encontram dentro do esperado de Call of Duty. Uma hora você está num
tiroteio gigante no meio de uma cidade no Oriente Médio, e em outra se esconde
em meio à escuridão para eliminar alvos numa operação secreta em Londres. Em
termos de gameplay, a série continua trazendo momentos cinematográficos e
variedade de mecânicas associadas à perspectiva em primeira pessoa, seja no
pilotar de um helicóptero, aviões de controle remoto, no ataque à distância com
uma sniper ou até mesmo controlando uma criança tentando sobreviver uma
invasão.
Diferente do Modern Warfare
original, essa nova versão quebra a perspectiva em primeira pessoa com o uso de
cutscenes excelentes e bem dirigidas (o visual do jogo é o tipo de coisa que só
é possível com um orçamento fora do comum), mas a grande parte da ação ainda
acontece enquanto você está com o controle na mão.
Essa sempre foi a principal arma
da campanha de Call of Duty: te manter dentro da ação, controlando o personagem
em cada um dos momentos dignos de cinema, olhando por seus olhos. O que muda,
entretanto, é o que essas missões demandam que você veja. Suicídios com bombas,
assassinatos, tiroteios em capitais como Londres e até mesmo a morte de
famílias — muitas vezes através das suas ações — estão entre os elementos mais
delicados que testemunhamos na história.
Em uma determinada missão, ao
infiltrar as casas de terroristas da Al-Qatala, não é incomum, após matar o
homem que mirava em você, ver sua esposa — chorando e gritando — pegar a arma
que seu marido usava para tentar te matar. A escolha é clara: mate-a ou perca o
jogo. Modern Warfare te força a olhar enquanto você aperta o gatilho. É brutal,
mas ao mesmo tempo, não é gratuito. Você sai de cenas como essa sentindo o peso
de um conflito como esse, o custo que isso traz para vidas humanas.
Ninguém representa isso mais do
que Farah, a líder do grupo que se rebela contra a ocupação russa e contra a
Al-Qatala no Urzequistão. Ela é uma verdadeira guerreira e suas missões contém
as cenas mais pesadas e emocionais da história, incluindo tortura e traição.
Price vai, sem dúvidas, tomar os holofotes pela sua popularidade com os fãs,
mas Farah é a estrela dessa campanha.
Os outros personagens também
recebem um bom desenvolvimento. Você terminará essa história com o rosto, vozes
e nomes dos protagonistas firmados em sua mente: Alex passa por uma boa
transformação na qual sai de uma ferramenta de guerra para alguém que realmente
acredita e defende uma causa; Garrick serve como nosso avatar, perdendo mais e
mais a inocência ao participar de missões de caráter moral duvidoso; e o velho
Price, claramente um veterano que já cruzou muitas linhas, mistura um carisma
de pai com a escuridão de alguém que está disposto a fazer quase tudo pela
missão.
Onde Modern Warfare deixa a
desejar é na hora de ir mais a fundo no que significa toda essa brutalidade. A
história do jogo se propõe a levantar os temas e apontá-los, mas não a explorar
a moralidade desses personagens. Há até uma cena entre Price e Garrick onde os
dois conversam sobre a linha que os separa dos vilões, mas ela rapidamente é
concluída em favor de mais tiroteios.
Ninguém espera necessariamente as
maiores reflexões filosóficas possíveis de Call of Duty. Esse ainda é um jogo
que se propõe, acima de tudo, a ser um blockbuster de ação. Entretanto, quando
você se coloca na posição de observar de forma mais honesta a guerra, certas
atitudes são esperadas.
E nisso, a campanha tem suas
falhas - incluindo algumas que vão além do jogo, como usar o nome da
Autoestrada da Morte, baseado em um crime de guerra real dos EUA durante a Guerra
do Golfo, em uma ação do exército russo no Urzequistão dentro do game.
Esse é o erro mais gritante do
jogo. Uma decisão estranha e desnecessária dos roteiristas. Em uma narrativa
que tenta mostrar o lado sombrio dos "mocinhos", essa atitude parece mais
propaganda revisionista do que uma tentativa de adicionar algo ao enredo.
Aliás, os russos parecem ser os vilões simplesmente porque também eram no
Modern Warfare original. Todo o esforço de tornar os protagonistas mais reais e
interessantes não é visto nos russos, que são pouco mais do que caricaturas de
generais famintos pelo poder.
Porém, ao mesmo tempo, esse é o
Call of Duty que mais aprofunda seus personagens e os torna intrigantes, sem
nunca apresentá-los apenas como heróis de perfeita moral. Ele dá um peso para a
arma virtual que você deve se imaginar segurando. Demanda de você que você
pense, mas não demais. Sua aspiração nunca foi ser Além da Linha Vermelha e sim
O Resgate do Soldado Ryan, mas é difícil terminá-lo sem desejar um pouco mais de
ousadia nesse sentido.
O modo história não acerta o alvo
em tudo que tenta, mas esse é um dos casos onde tentar é melhor do que só
repetir o que funcionou uma década atrás. Modern Warfare em 2019 não podia ser
igual a Modern Warfare em 2007, e o jogo sabe disso. Apesar de uns tropeços,
essa ainda é a melhor campanha da série em alguns anos.
O que você não vai precisar
desejar, entretanto, é o fanservice. Price não é o único conhecido que dá as
caras, mas o jogo sabiamente não se transforma num parque de diversões que usa
nomes como Soap e Ghost a cada missão. A conclusão, entretanto, vai deixar
todos os fãs da franquia sedentos por uma continuação.
Multiplayer e Spec Ops
O multiplayer de Modern Warfare
também quer, em muitos sentidos, voltar às antigas. O clássico sistema de criar
classe está de volta (1 primária + 1 secundária + três perks + dois
equipamentos), assim como as killstreaks. E, assim como Modern Warfare sempre
foi, você irá do céu ao inferno jogando o PvP.
A frenesia esperada de Call of
Duty está de volta. Partidas são rápidas e intensas, das mecânicas à
movimentação ao recarregamento, que dão ao jogador o sentimento de ritmo que
faz querer jogar só mais uma, tentar só mais uma rodada, e seus controles são
imediatamente responsivos. Você sempre sente que está a uma eliminação de
dominar o confronto, reconhecer seus erros e poder corrigi-los rapidamente, e o
transe de acabar com o time inimigo é verdadeiramente viciante.
Para alguém que gastou
incontáveis horas nos primeiros Modern Warfares, é fácil se sentir em casa
usando um Chopper Gunner para mirar no spawn inimigo. Mas algumas frustrações
antigas também estão de volta. Os próprios spawns são problemáticos e favorecem
armadilhas — encurralar o outro time no ponto onde eles nascem — até mesmo em
modos como Team Deathmatch, onde não há áreas controladas por uma das equipes.
A velocidade com que tudo acontece, dos tiros ao tempo de matar, significam que
mesmo o menor lag vai te deixar irritado.
Haverá vezes em que poderá jurar
ter começado a atirar antes do seu adversário, de que a última bala te acertou
depois que você já tinha dobrado a esquina para se esconder atrás de uma
parede. A vontade, nessas horas, é de jogar o controle fora e parar com tudo.
Mas você sabe, ou pelo menos
sente, que falta pouco, que com mais uma pitada de prática, mais um pouquinho
de experiência, nem mesmo esses erros vão te impedir de ser dominante.
Se esses problemas serão sempre
inerentes ao tipo de multiplayer de Call of Duty, se eles são o preço a ser
pago por uma experiência tão responsiva e eletrizante, então eles são
toleráveis.
Não é possível dizer o mesmo de
alguns mapas. A Infinity Ward parece ter seguido um caminho diferente aqui: nem
todos os mapas seguem a tradicional estrutura de três linhas de Call of Duty, e
isso nem sempre termina bem.
Cada arena parece ter uma
quantidade enorme de linhas de tiro, dando ao jogador informações demais para
processar. Você pode ser baleado de qualquer lugar e isso, por outro lado,
favorece mais o estilo de camperar e esperar, o que pode ser profundamente
frustrante quando você está do lado errado desse confronto.
É importante não descartar a
possibilidade, porém, de que podemos nos adaptar a isso. Talvez seja necessário
mudar a forma como jogamos para encarar esses outros tipos de mapas. Alguns,
como Piccadilly — basicamente uma arena oval — parecem ter sido apenas erros,
mas outros, como Aniyah Palace, oferecem estruturas interessantes.
Ainda há coisas para serem
alinhadas e elementos faltando — é estranho não poder votar no mapa desejado,
por exemplo — e às vezes parece que há jogadores demais, ou de menos, quando se
leva em conta o tamanho do tio de área, mas acredito que no geral esse é um multiplayer
dentro do desejado por fãs mais puristas da série.
Onde não podemos dizer isso é no
Spec Ops, disponível no modo Survival*, onde você deve sobreviver hordas cada
vez mais desafiadoras de inimigos, e no Clássico, que apesar do nome não parece
nada com o que vimos originalmente em Modern Warfare 2.
Ali, o Spec Ops era uma série de
missões variadas, com objetivos diferentes que realçavam os melhores aspectos
do gameplay de CoD. Aqui, a Infinity Ward parece ter tentado reproduzir algo
semelhante a raides, com áreas amplas que terminam parecendo subdesenvolvidas e
vazias, e objetivos que progridem e abrem novos alvos. Nenhum deles,
entretanto, é muito interessante.
O Spec Ops é a parte mais
estranha desse jogo, que em muitos sentidos pegou a fórmula do sucesso e soube
onde reproduzi-la e onde alterá-la. Enquanto esse modo cooperativo
definitivamente deixa a desejar, o multiplayer traz a mesma injeção elétrica
que esperamos de da série. Já a campanha, apesar de tropeços, é memorável.
Call of Duty não precisava de um
novo Modern Warfare, mas tanto para fãs que vão se sentir em casa como para
novatos que querem experimentar um jogo moderno depois de anos no futuro ou na
Segunda Guerra Mundial, não há como errar. Só não se esqueça: stay frosty.
* O modo Survival do Spec Ops é
exclusivo de PlayStation 4 por um ano
Por: Davi Silva
Fonte: theenemy
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