Dumbo
A escolha de Tim Burton para
dirigir o live-action de Dumbo foi uma das decisões mais acertadas da Disney
nessa era nostálgica de retorno aos seus clássicos. No original, a história do
elefantinho de orelhas grandes reflete sobre a aceitação e o aplauso ao
diferente com um toque de estranheza e uma acidez aconchegante, que estão no
DNA das obras do cineasta. Porém, no novo filme, Burton não se acomoda nas
obviedades que tornam essa união tão harmoniosa já no papel. Em vez de fazer um
mero remake, ele expande a narrativa, trazendo uma visão mais otimista e
honesta do que a animação dos anos 1940.
Sem os animais falantes, a
jornada de Dumbo para reencontrar a Sra. Jumbo e finalmente sentir-se parte de
um grupo agora é acompanhada pelos irmãos Farrier, crianças que estão crescendo
no circo e enfrentando seus próprios problemas. Mais do que não querer se
exibir para uma plateia, Milly (Nico Parker) e seu irmão Joe (Finley Hobbins)
precisam lidar com a perda da sua mãe e a volta do seu pai que, depois da
guerra, não parece mais o mesmo. É a identificação com o filhote que os deixa
decididos a ajudá-lo e, indiretamente, os fazem aprender a lidar melhor com
suas próprias dores.
Criar esse paralelo entre os
dramas de Dumbo com seus pares humanos é um recurso inteligente do roteiro de
Ehren Kruger para dar mais camadas a uma história originalmente áspera e determinista,
até na sua fofura. Mas isso funciona até certo ponto. Ainda que não falte
carisma ao elenco e, portanto, seja fácil torcer pelos Farrier e os membros do
circo dos Irmãos Médici, o desenvolvimento dos personagens deixa um pouco a
desejar. Se por um lado entende-se muito bem Dumbo, Milly e Joe, o pai das
crianças, Holt (Colin Farrell), e a artista Colette (Eva Green) ficam pelo
caminho. As dores e as intenções de ambos demoram a sair do discursivo para
serem efetivamente mostradas. Assim, a relação entre o público e os dois
personagens fica muito superficial, mesmo que estejam diante de situações
profundamente humanas. Entre os adultos, somente as figuras de Danny DeVito e
Michael Keaton, cada qual na sua caricatura, são bem resolvidas e, por isso,
roubam a cena.
No entanto, é inegável como Dumbo
se beneficia da nova configuração narrativa de Kruger. Ao não encerrar o filme
no mesmo ponto do original e, na realidade, expandir sua trama, o live-action
pode tratar abertamente dos temas negligenciados pela animação que, querendo ou
não, estão no centro da trajetória do protagonista. Evidenciando os maus-tratos
aos animais e o cinismo que a gerência do circo pode ter - simbolizados na figura de V. A. Vandevere (Keaton)
-, roteirista e diretor são mais honestos com o público e dão um tom otimista à
história.
Embora mude o encadeamento de
eventos aqui e ali, Burton sabe equilibrar seus toques pessoais com as
referências ao original. Ora com humor, ora com discrição, o diretor representa
de alguma forma os momentos emblemáticos do primeiro filme. Até mesmo a
sequência alucinada dos elefantes rosas encontra espaço no live-action - e sem
precisar embebedar o filhote.
O espetáculo visual arremata de
vez a experiência de Dumbo. Toda a construção dos circos, isto é, a
diferenciação entre a experiência decadente proposta por Max Medici (DeVito) e
a grandiosidade da Dreamland de Vandevere levam o espectador a embarcar nos
bastidores do picadeiro e na empolgante hora do show. Como consequência, não
apenas criam uma bela ambientação, com suas cores e coreografias, como dão peso
para as experiências dos personagens.
Assim, mais do que embarcar na
nostalgia vazia, Tim Burton justifica por que era interessante revisitar Dumbo
quase 80 anos depois. Em um tempo de tanta intolerância, é importante lembrar
que, em meio à cretinice banal do que é norma, existe uma magia no diferente. E
é sempre bom celebrá-la.
Por: azula
Fonte:omelete
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