Racionais MC's: revolução do Rap nacional em 30 anos de história
Mano Brown, Ice Blue, KL Jay e
Edi Rock são os Racionais MC’s e marcaram a história da música popular
brasileira e a identidade do Hip Hop nacional, fazendo parte da trajetória da
juventude negra e periférica dos anos 90.
O grupo trouxe em sua primeira
coletânea, intitulada Consciência Black, músicas como Pânico na Zona Sul e Tempos
Difíceis, que escancarou a desigualdade social brasileira, o genocídio e a
marginalização da população negra e pobre. As letras traziam reflexões sobre a
violência policial na favela, negritude e política para uma geração inteira que
cresceu ao som dos Racionais.
Um dos principais Djs do cenário
nacional e integrante do grupo, KL Jay, hoje com 50 anos de idade, fala da
contribuição dos Racionais para a formação de uma nova mentalidade, mais
consciente e de olhos bem abertos para as injustiças veladas que acontecem nas
periferias.
“Eu acho que os Racionais
influenciaram de uma maneira muito boa uma geração aqui no Brasil, mudou uma
mentalidade e revolucionou. O termo salvar, eu acho que é um pouco apelativo. A
gente ouve isso dos pretos, brancos, pobres, ricos, "vocês salvaram minha
mente". Então, os Racionais tem uma grande participação na mudança de
mentalidade e isso vale mais do que a fama. O que me deixa contente, não me
envaidece, é o respeito, a moeda mais cara”, explica KL Jay.
Depois de oito discos e 30 anos
de carreira, o grupo volta aos palcos com uma turnê especial que passará por
dez cidades do Brasil, com início em Florianópolis, em 20 de julho e
encerramento em São Paulo, no dia 12 de outubro. O show Racionais 3 Décadas -
turnê 2019 comemora sobretudo a vitória e a expansão do Hip Hop no Brasil e
reúne em seu setlist a união de músicas de toda a trajetória do grupo.
A realidade da juventude das
quebradas foi representada pelos versos de álbuns como o Sobrevivendo no
Inferno de 1997, que resiste ao tempo como um dos discos mais importantes do
Brasil. Em 2018, O CD ganhou uma versão impressa, com suas letras registradas
em um livro que leva o mesmo título do disco, publicado pela Companhia das
Letras.
Por tamanho impacto na literatura
e na história da música popular brasileira, o conteúdo do livro intitulado
"Sobrevivendo no inferno" integra a lista de obras obrigatórias para
a prova da Unicamp, em 2020. O professor
de literatura brasileira da Universidade Federal de Pernambuco, Acauam Oliveira
é autor do prefácio do livro e explica o que o grupo traz musicalmente nessa
turnê.
“O show está numa pegada mais
dançante, mais Black Music, melodioso e acompanhando várias das mudanças
recentes do Rap, como o trabalho do Emicida e do Baco, que são mais dançantes e
melodiosos, e combinou a linguagem das músicas antigas com as mais recentes.
Isso tem tudo a ver com aquilo que os próprios Racionais vem falando tem um
tempo, de que o Rap precisa voltar para o baile e para a pista. Porque para o Rap se comunicar com a quebrada
precisa voltar a dançar e tal e isso é uma coisa que o Mano Brown, o Edi Rock,
O Kl Jay e o Ice Blue estão falando”.
Ao longo dos últimos anos, o Rap
nacional passou por diversas mudanças e questionamentos. Abordagens de pautas
identitárias como a transfobia, o feminismo, a homofobia e a gordofobia, por
exemplo, que não eram vistas no ritmo, hoje sobrepõem o machismo e a misoginia
de algumas letras.
Grandes nomes do Rap nacional
como Karol Conka, Tássia Reis, Brisa Flow, Preta Rara, Criolo, Emicida e Baco
Exu do Blues, por exemplo, acabam marcando um novo cenário e incluindo mais
representatividade para o gênero musical no Brasil.
Acauam explica como a inclusão de
temas atuais geram mudanças também no posicionamento dos Racionais, que passam
por uma apropriação dessas pautas. A música “Mulheres Vulgares” do grupo, hoje
não é mais cantada e passagens machistas são ponderadas ao vivo em seus shows.
“Do final dos anos 80 e 90 para
2010, o sujeito que faz Rap mudou. Com outro tipo de debate que não tinha nos
anos 90. O público mudou e se ampliou, assim como as pautas e junto com isso, o
ritmo se abriu para várias questões identitárias que não estavam em pauta nos
anos 90. A mulher era sempre tratada como algo a ser excluído, era
marginalizada dentro do movimento Hip Hop, a questão LGBT só aparecia de forma
negativa. Esse debate identitário que é novo, pelo menos em termos de
popularização, ele encontra um eco no Rap que não tinha antes”.
O Dj KL Jay conta que as mudanças
na música dos Racionais também acompanham essa nova geração, com batidas novas
e mais modernas, músicas menores e diversifica os assuntos das letras. Ele
explica que o público sempre espera que as músicas falem de opressão ou
política, mas o crescimento musical do grupo também permite cantar as vitórias.
Por:Luiz Felipe
Fonte:brasildefato
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